O Senado Federal aprovou, na última semana, o Projeto de Lei 2.159/2021, que institui a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A proposta, que tramita no Congresso há mais de duas décadas, pretende estabelecer regras claras e unificadas para os processos de licenciamento em todo o país. O texto agora retorna à Câmara dos Deputados.
Segundo análise da advogada Samanta Pineda, especialista em Direito Ambiental, o projeto representa um avanço ao propor mais segurança jurídica, prazos definidos e procedimentos objetivos, sem abrir mão da responsabilidade ambiental. A proposta mantém instrumentos tradicionais da legislação, como o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), o Plano de Controle Ambiental (PCA) e o Plano Básico Ambiental (PBA).
Além disso, o texto cria novas modalidades de licenciamento, como a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), voltada a atividades de baixo impacto; a Licença Ambiental Única (LAU), que concentra todas as fases do processo em uma só autorização; e a Licença de Operação Corretiva (LOC), destinada à regularização de empreendimentos que operam sem licença.
Samanta destaca que, ao contrário do que vem sendo divulgado, o projeto não fragiliza a legislação ambiental nem representa uma liberação indiscriminada. Pelo texto, atividades com impacto positivo, como reciclagem e tratamento de esgoto, ou realizadas em situações emergenciais, podem ser dispensadas de licenciamento. Já no caso do setor agropecuário, as obrigações previstas no Código Florestal continuam válidas, com exigências sobre reserva legal, APPs, uso do solo e inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Outro ponto central do projeto, segundo a especialista, é o respeito à Lei Complementar 140/2011, que determina a repartição de competências entre União, estados e municípios. Isso significa que os entes federativos continuarão obrigados a seguir diretrizes federais e não poderão autorizar empreendimentos fora dos critérios legais.
O projeto também trata do chamado “autolicenciamento”, que tem sido alvo de críticas. Mas Samanta explica que ele é restrito a atividades de baixo impacto e segue critérios técnicos definidos. Essa modalidade está sujeita a fiscalização, penalidades e até cancelamento em caso de irregularidades ou falsidade nas informações prestadas.
Além disso, o texto não prevê anistia a crimes ambientais. O que se permite é a possibilidade de regularização para quem opera hoje sem licença, mas isso não elimina a obrigação de reparar danos nem o cumprimento de sanções. A análise de impactos sobre terras indígenas, comunidades quilombolas e unidades de conservação também permanece obrigatória. A principal mudança está na definição de prazos: os órgãos ambientais terão tempo limitado para se manifestar, o que promete mais agilidade e previsibilidade.
Para o chefe-geral da Embrapa Territorial, Gustavo Spadotti, o projeto representa um avanço técnico importante. Ele ressalta que um dos principais entraves hoje não é a exigência ambiental em si, mas a subjetividade nos critérios de análise.
“A lei veio no sentido de tirar a subjetividade, que hoje é o principal ponto que trava não a aprovação, mas a análise dos licenciamentos.”
Spadotti destaca que a proposta traz objetividade e prazos claros, permitindo que o processo seja conduzido com mais eficiência.
“A nova proposta tem como caráter a objetividade e os prazos, para que finalmente se cumpra com a lei e com a emissão das respostas dos requerimentos de licenças – seja a resposta positiva ou negativa.”
E faz um alerta sobre interpretações equivocadas da medida: “Não se está abrindo a porteira. Está se dando meios e prazos para o cumprimento da função do licenciamento ambiental.”
Em vídeo publicado nas redes da FGVAgro, o pesquisador Leonardo Munhoz também reforça que o projeto não desobriga produtores das exigências legais. Segundo ele, a isenção de licenciamento para algumas atividades agropecuárias não anula o cumprimento do Código Florestal.
“Mesmo as atividades isentas continuam obrigadas ao Cadastro Ambiental Rural, à manutenção das APPs, reserva legal e, se necessário, adesão ao Programa de Regularização Ambiental.”
Munhoz lembra ainda que o desmate legal e qualquer conversão de uso do solo continuarão dependendo de autorização formal dos órgãos competentes – o que reforça a vinculação entre o novo modelo de licenciamento e a legislação ambiental já em vigor.
Com a aprovação no Senado, o PL 2.159/2021 segue para nova análise na Câmara dos Deputados. A Frente Parlamentar da Agropecuária articula um requerimento de urgência para levar o texto diretamente ao plenário. Por outro lado, organizações ambientais já cogitam acionar o Supremo Tribunal Federal, caso o projeto avance sem alterações.